quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

A sociedade portuguesa está com medo

Por Joaquim Aguiar,

 A sociedade portuguesa está com medo mas não pode deixar de estar porque está a sentir-se traumatizada, porque lhe estão a tirar todos os critérios do passado sem lhes propor outros. 

Porque mesmo aqueles que dizem que é preciso austeridade para corrigir os excessos, a única coisa que dizem é que vamos voltar ao equilíbrio anterior. Ora o equilíbrio anterior já não existe, e se voltássemos ao passado era só para voltarmos a criar o mesmo problema. O futuro tem que ser uma descontinuidade. 

Numa crise deste tipo, o presente não liga o passado com o futuro e quem ficar a olhar pelo retrovisor tem um acidente. Agora se esquecer o retrovisor, aquilo que vê à frente é o que lhe oferece a solução para o presente. E o que estamos a ver à frente? Competitividade, necessidade de atrair investimento dos outros porque nós não temos capital nem tempo para o reconstituir. E onde não há capital não há trabalho, da mesma maneira que onde não há ricos só há pobres. 

Nós temos de reconstituir uma sociedade com tensão interna suficiente para ser criativa: isso é uma sociedade competitiva. Claro que podemos ter uma sociedade com tensão interna autoritária, foi nisso que caímos com a troika. A troika é um fator autoritário, não resolve nada dos problemas de futuro porque não é a desigualdade autoritária o que nós precisamos, a distinção entre os senhores e os escravos, o que precisamos de ter é a desigualdade competitiva, que significa interiorizar o que é exterior, ver como os outros estão a fazer e como podemos fazer a mesma coisa melhor. 

O grande drama de quem não tem crescimento é que, faça o que fizer, ninguém vai querer comprar o que está a produzir, e então há uma regressão. A espiral regressiva não é grave se batermos no fundo e voltarmos, mas é destruidora se batermos no fundo e estagnarmos. (...) [Os que vão efetuar o salto são os] que têm competências e não têm capacidade de as aplicar porque a sociedade estagnou. 

São esses que vão criar as novas condições para o futuro. Mas como não têm recursos, são os recursos externos que vão dinamizar as novas lideranças. Na sociedade portuguesa há dois terços de adaptados e um terço de inquietos. É neste um terço de inconformados que, perante a experiência da crise e a nova inteligência sobre o que são os limites da regulação, vão conduzir politicamente projetos que não sejam distributivos e sejam competitivos. (...) 

[Os agentes federais são] os inoculadores das energias competitivas. Porque eles têm de resolver o problema europeu. 

A geração que nascer nesta crise vai ter uma cultura política muito mais centrada na crise do que na expectativa do paraíso.»


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